O psicanalista Garcia-Roza a partir de Deleuze caracteriza o mecanismo de repetição em quatro possibilidades e pontos de coincidência: 1º – A repetição implica algo novo, está vinculada a uma seleção e colocada como objeto supremo de liberdade e da vontade. Repetir não é contemplar nem lembrar, mas atuar, trata-se de fazer da repetição como tal uma novidade, quer dizer, uma liberdade e uma tarefa de liberdade. Ela pode ocupar tanto um aspecto negativo quanto produtora de novidade, segundo Freud. 2º – A repetição se opõe às leis da natureza; ela diz respeito ao que há de mais interior na vontade e não às mudanças e igualdades que se dão em conformidade com as leis da natureza; 3º – A repetição se opõe à lei moral; é obra do solitário, é o logos do pensador privado; 4º – A repetição se opõe às generalidades do hábito assim como às particularidades da reminiscência, ou seja, a uma retenção de conteúdos existentes na memória.
Quando falamos do Princípio da Repetição como um dispositivo do inconsciente, tratamos de um objeto primordial a ser trabalhado no processo psicanalítico. O paciente sem se dar conta, vem há anos cometendo determinadas atitudes ou realizando escolhas sempre dentro dos mesmos padrões de comparação com alguma referência pré-estabelecida. Isso acontece nas relações sociais – amizade, namoro, casamento, trabalho -, nas emoções – sempre repetindo a mesma reação diante de determinados ocorrências -, e inclusive fisiológicas – apresentando dificuldades de realizar mudanças nos hábitos de alimentação -.
Esse mecanismo do inconsciente serve tanto como válvula de resistência perante às mudanças da vida, como também, se faz possível – e geralmente assim que se dá -, em algum momento em que a repetição ocorre o paciente descobre algo novo dentro de seu ato e se depara com uma nova possibilidade de saída deste círculo vicioso, que se não elaborado, pode levar o sujeito a manter determinados hábitos e escolhas que tendem sempre ao fracasso de suas atitudes, ao invés, de inaugurar algo novo desconstruindo suas repetições e consequentemente desarmando suas resistências psíquicas.
Não é intrigante e excitante a possibilidade de desvendar um determinado evento ou acontecimento que há dentro de si, o qual você ainda nem tem dimensão que o mantêm, e no qual pode não só estar carregado de conteúdos de potência negativa, talvez levando a alguma forma de adoecimento; como também, talvez, recheado de possibilidades novas e de potencialidades outrora desconhecidas pela pessoa?
Márcio Junio Fagundes do Vale
Psicólogo/Psicanalista
CRP 04/35602
@marcio.jfvale.psi
31 98964 0004